O dilema “alto risco, alta recompensa” costuma ser controverso. Há muitas maneiras de construir riqueza, assim como muitas formas de destruí-la.
O influente artigo de Michael Cembalest, “The Agony & the Ecstasy” (atualizado mais em 2021), explorou os riscos e as recompensas de manter posições concentradas no caso de clientes de elevado patrimônio líquido. Após analisar dados de ações americanas por quatro décadas, algumas das principais descobertas foram:
Do petróleo e a mineração aos automóveis e a manufatura, as indústrias da América Latina criaram grandes fortunas, mas o sucesso às vezes custa caro. De gigantes como México e Brasil a exemplos de cautela, como a Venezuela, à medida que as indústrias evoluem e se transformam, e as políticas e administrações públicas vêm e vão, algumas empresas se adaptam e prosperam, enquanto outras lutam para sobreviver e deixam de existir.
Examinamos ações em sete países (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Peru e Venezuela), e a regra se aplica a todos eles: independentemente de experiências positivas ou negativas, o nível de concentração mantido por um investidor magnificou as consequências.
No geral, embora posições concentradas em ações possam criar riqueza considerável, elas também vêm com uma probabilidade de perda expressiva que pode prejudicar o futuro financeiro que você imagina para si e sua família. E, se há alguma conclusão a ser tirada de 2022, é que tudo pode acontecer. Uma pandemia global, uma guerra imprevista, inflação elevada, crescimento inconstante e condições monetárias restritivas em um curto período levaram a um dos piores desempenhos vistos em várias classes de ativos. Dito isso, a diversificação provou seu valor, pois pode ajudar a proporcionar retornos mais sólidos para a carteira no longo prazo.
Qual é a probabilidade de investimento em uma empresa “perdedora”?
Os fatos históricos indicam que os riscos são elevados. Analisamos todos os constituintes históricos do índice MSCI Emerging Markets (EM) Latin America de janeiro de 1995 a março de 2023 (o máximo de dados publicamente disponíveis) para tentar responder a essa pergunta em relação à nossa região.
Pouco mais de 30% de todas as empresas que já foram negociadas no índice experimentaram uma “perda de preço catastrófica”, em que a ação caiu 70% ou mais em relação aos níveis máximos e não se recuperou desde então. Em todos os setores, com exceção dos serviços públicos e energia, 20% ou mais dos constituintes do índice de cada setor sofreram uma perda catastrófica. Nos setores de consumo discricionário e assistência médica, afetados por fatores endógenos e exógenos, essa perda tem sido especialmente severa.
ANÁLISE DO ÍNDICE MSCI EMERGING MARKETS LATIN AMERICA, 1995-2023
A maioria (44%) das ações que enfrentaram perdas catastróficas são de empresas de porte médio, um ponto relevante para proprietários de empresas e executivos. Além disso, Colômbia (43%) e Peru (39%), as menores economias da América Latina entre as cinco primeiras, concentraram a maioria das perdas catastróficas, algo que não é atribuível ao seu tamanho relativo em comparação com os outros países representados no índice, mas sim ao seu crescimento defasado e regime político volátil.
Como outra maneira de pensar sobre o risco de concentração, considere com que frequência um investidor estaria melhor se tivesse mantido dinheiro em espécie ou investido no mercado mais amplo em vez da posição concentrada. Com base na nossa análise histórica, uma posição concentrada em uma única ação teria trazido retornos absolutos negativos cerca de 26% do tempo, ficando aquém de um simples investimento em dinheiro. Assim, cerca de 51% do tempo, uma posição centrada em uma única ação teria tido desempenho inferior a uma posição diversificada no índice MSCI EM Latin America.
DISTRIBUIÇÃO DO EXCESSO DE RETORNO AO LONGO DA VIDA DE AÇÕES INDIVIDUAIS VERSUS O ÍNDICE MSCI EM LATIN AMERICA, 1995-2023
Número de ações
A culpa é do tempo.
Embora haja algumas empresas que sofreram devido a decisões de gestão inadequadas, na realidade, a maioria dos fracassos corporativos analisados pode ser atribuída a riscos exógenos, como dinâmicas macroeconômicas, decisões políticas/regulatórias ou mudanças setoriais. Às vezes, a causa do problema é não se adaptar rapidamente o suficiente a um ambiente em transformação, ou talvez a empresa ainda esteja em processo de mudança e a recuperação ainda esteja por vir. Nesse caso, a pergunta passa a ser se os investidores estão dispostos a esperar ou, se ao considerar o cenário elevado para as taxas de juros, o custo de oportunidade se torna muito alto.
Uma ressalva importante a ser feita aqui: os entraves tendem a se acumular. Embora uma macroeconomia fraca possa ser o catalisador que arrasta os preços das commodities, uma empresa do setor de materiais sofre com ambos.
CERCA DE 67% DAS PERDAS CATASTRÓFICAS ANALISADAS NA AMÉRICA LATINA FORAM PROVOCADAS POR FATORES EXÓGENOS*.
Assim, vamos abordar alguns dos principais impulsionadores das perdas catastróficas em toda a região:
1. Política e macro
A história econômica moderna da América Latina tem sido permeada por crises econômicas, na maioria das vezes impulsionadas por políticas públicas desfavoráveis. Em alguns casos, o impacto tem sido extremo (por exemplo, Argentina e Venezuela), enquanto em outros, tem ocorrido em ondas (por exemplo, Brasil ou Colômbia). Estabilidade não é uma palavra a ser usada para descrever nossa região, seja politicamente ou no plano macro.
PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB): A INSTABILIDADE É UM FATOR IMPORTANTE AO INVESTIR NA AMÉRICA LATINA
PIB da América Latina, trimestre a trimestre
AS MOEDAS LATINO-AMERICANAS TENDEM A SER BASTANTE VOLÁTEIS
Desvio padrão anualizado dos últimos 10 anos
Do ponto de vista das empresas, as quedas macroeconômicas têm sido a terceira razão mais comum para as perdas catastróficas das empresas. Como era de se esperar, este aspecto é sobretudo relevante para empresas em setores cíclicos, como o consumo discricionário, o de materiais e o financeiro. Em muitos casos, as quedas macroeconômicas foram apenas a faísca necessária para incendiar uma empresa inflamada por dívidas ou que cresceu rápido demais. Em outros casos, foi um choque exógeno o modo como a pandemia da COVID-19 causou o declínio de uma empresa, principalmente no setor relacionado ao consumo.
No âmbito político, a Venezuela serve como exemplo de cautela. Má administração de políticas públicas, falta de responsabilidade institucional, um sistema fraudulento de câmbio de moeda, falta de confiança nos setores público e privado, e pouca ou nenhuma autonomia institucional foram alguns dos impulsionadores por trás de um dos maiores êxodos de capital que já vimos.
Aqui, ocorreram dois problemas principais que levaram à ruína de várias empresas: hiperinflação combinada com um sistema defeituoso de câmbio de moeda e risco político – ou melhor, confisco, expropriação ou nacionalização pelo governo.
No que diz respeito ao primeiro problema, à medida que a hiperinflação na Venezuela se agravava, os lucros eram diluídos. Ao mesmo tempo, o bolívar oficial da Venezuela (o obtido por meio do sistema oficial de câmbio de moeda) se desvalorizou, e o bolívar do “mercado negro” (o acessível às massas) desvalorizou ainda mais – a ponto de nem sequer conseguirmos acompanhar lucros obtidos por qualquer empresa.
Quanto ao segundo, a expropriação ou nacionalização é um risco conhecido em países com regimes autoritários. Nesse caso, o fato de o governo poder tomar sua empresa repentinamente levou a uma fuga de capital privado. E, o que talvez seja ainda mais importante, empresas bem estabelecidas na Venezuela decidiram desinvestir todos os ativos venezuelanos e estabelecer novas sociedades de responsabilidade limitada ou holdings no exterior para se protegerem de uma possível expropriação. Enquanto essas empresas ainda eram lucrativas no exterior, seus lucros na Venezuela e o preço das ações despencaram.
Naturalmente, essas questões levaram a oportunidades de arbitragem na região, onde os investidores puderam maximizar seus ganhos devido à falta de autoridade ou transparência.
Embora este possa parecer um cenário extremo, a América Latina é em grande parte governada por administrações com inclinação política à esquerda. Enquanto algumas parecem mais racionais do que outras, nunca se pode descartar surpresas negativas. A Argentina, por exemplo, tem enfrentado dificuldades há algum tempo. Agora, com uma inflação que ultrapassa a marca de 100% a.a. e um peso oficial de aproximadamente 230, enquanto o peso “paralelo” está sendo negociado a cerca de 470, não está longe de um cenário semelhante ao da Venezuela. Na verdade, embora nossa análise interprete apenas 6% das ações argentinas como “perdas catastróficas”, se considerarmos todos os recibos de depósitos, esses números aumentam para cerca de 24%. Por quê? O descompasso entre o dólar oficial e o “paralelo”, juntamente com a hiperinflação, explica grande parte do que impulsiona a questão aqui.
1. Quedas nos preços das commodities
Em uma região onde, historicamente, os materiais representaram uma média de 21% do índice e uma média de 80% dos saldos comerciais dos principais países, os preços das commodities devem ter tido um impacto significativo nas empresas da América Latina. Quedas acentuadas nos preços das commodities explicam 15% das perdas catastróficas em nossa análise, principalmente no Brasil e no Peru.
2. Mudanças regulatórias
Alterações nos limites das taxas de seguro e nos salários mínimos para enfermeiros, aumento da concorrência e repercussões da pandemia somaram mais problemas nos setores de saúde e seguros no Brasil. Enquanto isso, o setor educacional brasileiro sofreu com mudanças no programa governamental de empréstimos estudantis (o FIES), gerando questionamentos sobre a sustentabilidade do crescimento acelerado das empresas do setor nos últimos anos. E, em 2020, o setor foi ainda mais impactado pela pandemia da COVID-19, com queda nas matrículas e contração das margens.
3. Mudanças setoriais
A pandemia da COVID-19, o mundo digital, o streaming... escolha seu vilão. As empresas são constantemente atingidas por choques exógenos, mas quando essa mudança é uma alteração estrutural na dinâmica do setor, sua capacidade de se adaptar é realmente colocada à prova.
O setor imobiliário brasileiro sofreu um golpe fulminante durante a crise financeira global, arrastado pela queda na demanda por moradias e pelo aumento das taxas de juros, efetivamente encerrando o boom habitacional no país que fez empresas acumularem fortes dívidas.
O setor varejista brasileiro também não foi poupado do impacto que a pandemia da COVID-19 e os bloqueios causaram na indústria global. No entanto, ambos não conseguiram se recuperar após a reabertura, pois a inflação elevou os custos.
As construtoras mexicanas se beneficiaram de uma onda de crescimento ao longo dos anos 2000, seguindo um aumento na demanda à medida que o governo investia em programas de habitação acessível. As empresas alavancaram para acompanhar o crescimento acelerado, principalmente ao acumular terrenos que se tornariam inúteis posteriormente devido a mudanças na lei de subsídio habitacional implementada pelo governo entrante do presidente Pena Nieto em 2008. A crise foi agravada pela crise financeira global e a desvalorização do peso mexicano, levando a aumentos insustentáveis nas despesas de juros. Alguns anos depois, o setor teve um retorno moderado contrariado por uma mudança nos subsídios públicos para a construção de apartamentos em áreas urbanas em vez de casas individuais em comunidades rurais.
4. Gestão corporativa
E, é claro, existem empresas que simplesmente escolheram seguir a rota errada em algum momento. Às vezes, crescer rápido demais não é uma boa ideia.
A resposta está na diversificação
A concentração pode levar à criação de riqueza substancial, mas eventos imprevisíveis podem destruí-la rapidamente. Assim, a diversificação é fundamental. O caminho mais fácil é vender uma posição concentrada e aumentar a exposição em outros lugares. No entanto, para muitos investidores, se desfazer de posições concentradas em uma carteira simplesmente não é uma opção, seja por motivos fiscais, pessoais ou até mesmo regulatórios. Nessas situações, existem diversas estratégias que podem ajudar a mitigar o risco de concentração. Algumas delas permitem que os investidores monetizem suas posições sem vender, criando liquidez para investir em outros lugares, ou simplesmente protegendo a exposição para se resguardar contra recuos não antecipados. A melhor estratégia será aquela que se ajusta às circunstâncias únicas de cada investidor e que está alinhada com seus objetivos de longo prazo.